Senta que lá vem história 18 Eduardo Lucas Serapião

Publicado em: 03/04/2023 14:41:37

Programa de Pós Graduação em Ensino de Ciências da Natureza


É comum encarar a vida como uma sucessão de escolhas, que proporcionam experiências que formarão a nossa história. Nosso livre arbítrio nos permite experienciar boas e más oportunidades, e essas vivências acabam nos constituindo como seres humanos portadores de legados. Mas entre o livre arbítrio e o legado existe um longo caminho e muitas escolhas (sob a tutela daquilo que concebemos individualmente como moral e/ou ética).

Me chamo Eduardo Lucas Jorge Serapião, tenho 42 anos, sou professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico no campus Cacoal do Instituto Federal de Rondônia e o mais remoto que minhas lembranças me leva é a história de meus pais, casados e morando no noroeste do Paraná, meu pai farmacêutico-bioquímico e minha mãe pedagoga, e em 1980 (ano que nasci em Paranavaí-PR), diante das dificuldades profissionais, decidem vir para a nova fronteira, migrando para Cacoal-Rondônia, primeiro vem meu pai e em 1981 venho eu e minha mãe, e de início enfrentamos as austeridades impostas pela falta de recursos, em uma terra repleta de oportunidades a serem desbravadas. Ao passar dos anos meus pais começam a se estabelecer, meu pai abre um laboratório de análises clínicas logo que chega e em 1983 minha mãe começa a trabalhar na escola Antonio Sanchez De Larragoiti Y Curdumi (Fundação Bradesco), escola que tive oportunidade de estudar por 11 anos, pude vivenciar da infância à adolescência o ensino fundamental e o técnico.

Na infância fui um bom aluno, mas na adolescência tive algumas dificuldades, especialmente pela falta de atenção e desinteresse na escola, e na sétima série, vivenciei uma reprovação e um resgate no conselho de classe. O temor de “perder um ano” mexeu comigo e nos anos seguintes voltei a me centrar nos estudos e melhorar (um pouco) como aluno. Essa fase da minha vida de estudante me permite compreender e tentar intervir quando um aluno se distancia da minha aula ou se desinteressa, além de ponderar muito sobre as ações que tomo em um conselho de classe.

O meu processo de formação inicial se dá entre o final dos anos 80, nesse período pude encarar um misto tendências pedagógicas que flertavam entre o tecnicismo/positivismo e o progressismo, nesse caminho pude concluir o ensino fundamental e ingressar no ensino técnico, onde pude cursar o curso técnico em administração de empresas, em uma formação que de certa forma me distanciava do vestibular (curso colegial) e minimiza possibilidade de ingressar em uma graduação. Ao longo dos anos da minha formação técnica, meus pais percebiam que era necessária uma complementação, assim no terceiro ano meus pais me matricularam em outra escola, e cursei simultaneamente o ensino técnico no período noturno, e o curso colegial no período matutino, além de fazer complementação das disciplinas que não havia cursado no período vespertino. Em suma, estudava três períodos, em um ano extremamente desgastante, mas obtive êxito nas duas formações, apesar de ser um aluno mediano. Para o meu “eu docente” fica a reflexão sobre entender a realidade de cada um dos meus alunos antes de tentar fazer um juízo, já que a notação do resultado de uma avaliação muitas vezes é muito simplória no entendimento do contexto de vida dos estudantes e exigem um olhar mais profundo sobre as motivações do seu baixo rendimento.

Pude então fazer o vestibular e obtive êxito em uma universidade particular em Santa Catarina (UNIVALI), onde pude iniciar a graduação em ciência da computação em 1998, onde cursei 3 semestres e retornei para Cacoal em 1999 sendo transferido para a primeira turma do curso em tecnologia em informática. Na graduação tive grandes professores que serviram de base para o meu senso de docência, tive também outros que me deram a referência de como não atuar. Ao findar da graduação em 2002, pude me dedicar exclusivamente a construção do meu eu profissional, então dei sequência à carreira na área da informática, aplicando conceitos que nasceram na infância e foram assentados na graduação. Pude atuar em três empresas, empregando os meus conhecimentos de informática tecnicamente, porém como seres sociáveis, acabamos estabelecendo vínculos, que a atuação profissional nos obriga a criar, nessa atuação o perfeccionismo e o excesso de doação de si herdados da minha mãe, junto com o senso de ética e honestidade herdados do meu pai, me fizeram obter êxito nas empreitadas profissionais como funcionário. Onde aos poucos minha atuação exigia que eu “ensinasse” as pessoas a manipularem as ferramentas da informática. Volta e meia essas pessoas me inquiriram sobre a possibilidade de ensinar (como professor) e eu procurava evitar ou me esquivar dessa possibilidade. Nessa fase após a graduação conheci a minha esposa, que teve e tem o papel de trazer foco a minha vida. Pude também fazer uma pós-graduação (latu sensu) na minha área de atuação em 2005, e nessa época o aluno em mim que gostava do “fundão” na graduação, veio para as primeiras fileiras, e permanece nelas até hoje. Na atuação da minha área de formação pude vivenciar a realidade que levo aos meus alunos no dia de hoje, a atuar profissionalmente pode forjar um professor que sempre busca vincular a teoria à prática.

Em 2007 me casei, e o casamento obriga a um processo de maturação e responsabilidade, que acabou refletindo na minha atuação profissional, então em 2008 surgiu uma motivação para amadurecer, me propus ao desafio de perder o medo de falar em público, e decidir encarar um processo seletivo para professores que o SENAC realizou como desafio alto proposto. Esse processo demandou realização de um questionário e duas bancas de avaliação da docência, me preparei espelhando todos os bons professores e todas as boas práticas que vivenciei desde a educação infantil, passando pela graduação e pós-graduação. Obtive êxito e pude ingressar em uma atuação profissional que mudou a minha vida, me permitiu vencer o desafio de me expressar publicamente e me trouxe uma gama de novos desafios: como a docência na educação profissional.

Ingressar como instrutor no SENAC pôde me preparar para a atuação na docência sob o enfoque da formação para a atuação no mercado, pude então aplicar o ensino que alicerça da teoria à prática, nessa atuação vivenciei as dificuldades pois de maneira automatizada acabava atuando como aquele professor tecnicista (já que essa metodologia caia como uma luva na formação profissionalizante), nessa fase inicial tive alguns dissabores com essa forma de atuar, e me obriguei a buscar formações na tentativa de melhorar como docente. Pude fazer então mais duas pós-graduações (latu sensu), sendo: Metodologia e didática do ensino superior e Didática para a educação profissional. Ambas tiveram um papel importante na minha reconstrução como docente que agora ainda anseia alicerçar a teoria à prática em um ensino que forme um cidadão crítico e reflexivo da sua realidade.

Outro marco importante nessa fase foi a paternidade em 2010 e novamente em 2012, ser pai me fez ter um olhar diferente e de mais responsabilidade sobre a formação dos meus alunos e o papel dessa formação em seus futuros, além de me obrigar a ser o professor que desejo que meus filhos tenham.

Nesta mesma época a rede federal se expande, e com uma proposta de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, surge o IFRO e, mesmo sem conhecer a proposta dessa instituição me lancei ao desafio de tentar ingressar nela, fiz três tentativas, até ser aprovado na quarta, tomar posse e entrar em exercício em 2014 no campus Vilhena do Instituto Federal de Rondônia, como professor de informática do curso técnico integrado e subsequente. Esse foi outro marco importante da minha vida, e nesse campus vivenciei muitas alegrias e aprendizados com os servidores e alunos, apesar de estar um pouco longe da minha família, que continuou em Cacoal. Em 2016 consegui minha remoção ao campus Cacoal e agora sim me senti completo por estar em uma instituição incrível, por seus profissionais e alunos, estando junto aos meus familiares. Outra alegria vivenciada nessa época foi o ingresso na gestão, onde permaneço até o momento como coordenador do curso técnico em informática.

A atuação no IFRO me obriga a melhorar constantemente a minha atuação como docente, então em 2018 pude ingressar na Formação Pedagógica para Graduados não Licenciados, com o anseio de preencher as lacunas da minha formação tecnológica, na minha atuação como docente.

No campus Cacoal, após seis anos na gestão decidi me especializar, tendo como exemplo outros professores que participaram de especializações stricto sensu e modificaram para melhor sua atuação docente. Nessa perspectiva, o edital para seleção de aluno especial do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências da Natureza (PGECN) surge e a oportunidade de realizar uma disciplina me aproxima do programa de mestrado, posteriormente pude defender meu projeto e obter êxito como aluno regular e com a esperança de melhorar como docente, e por meio do meu projeto de pesquisa, deixar algum legado para a sociedade.

Esse olhar para si nos compete o questionamento sobre nossa evolução como seres humanos e o que ainda podemos fazer, pois a vida é uma constante construção e reconstrução de nossa personalidade, crenças e atuação em um processo evolutivo sem fim, a partir das nossas escolhas, frente ao nosso livre-arbítrio.

 

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Fonte: Eduardo Lucas Serapião